Sobre o mundo e a vida
“Não é justo que pessoas sofram.” Esse pensamento passou por mim em mais um dos episódios trágicos das leituras matinais de notícias. Guerras, fome, perdas econômicas, traições. Tanta gente boa por aí passando por situações horríveis. Por amor, saúde, dinheiro. Essas dores se somam e podem transformar pessoas felizes em seres ranzinzas, utilitaristas e, ao final de acúmulos de problemas, menos humanas. A dor parece roubar um pedaço de vida de muita gente. Não é justo.
Nessa breve briga com o Universo, percebo minha infantilidade ao me indignar com as leis naturais da vida. Sorrio e balanço a cabeça. Mesmo que só racionalmente, começa o processo de aceitação.
O mundo não é sobre justiça. É sobre probabilidade.
Foquemos no nível individual. Algumas chances são lançadas antes de nascer. Como são o lugar, a família, a estrutura em que essa criança vai nascer? Ela vai estar dentro dos padrões de desenvolvimento que aquela sociedade valoriza? Ela vai corresponder ou não às expectativas? De cara, várias batalhas já estão desenhadas aí.
Aí vem a criação. Com as ideias teve contato? Elas mudam as probabilidades de sucesso nas suas batalhas. E dão consciência pra escolher as batalhas que fazem sentido pra esse ser.
Na vida adulta, os reflexos ficam evidentes. Se viu alguém em casa ir pra faculdade, sua chance de chegar lá aumenta. “69% dos filhos cujos pais terminaram o ensino superior seguiram o mesmo caminho. Entre pais que nunca foram à escola, a chance de um brasileiro alcançar um diploma universitário é de apenas 4,6%”(2017).
O mundo em que vivemos é composto por grupos de indivíduos privilegiados no poder de tomarem decisões que afetam o globo. Privilégios comprados ou ao acaso, esses conjuntos de fatores individuais e sociais compõe tudo que influencia externamente as nossas vidas. E por isso, gostaria de reforçar a diferença entre mundo e vida.
A vida e o mundo
Pois bem, o mundo é doido e sobre isso não restam dúvidas. Ele nos apresenta a vida como uma corrida. E dá vantagens ao acaso. O mundo é meio injusto mesmo. Material, limitado, humano e desiquilibrado.
Mas o mundo não é a vida.
A vida é como você experimenta o mundo. Como você interage com ele, como decide se posicionar a cada dia. A vida é infinita. Ela é esse comichão aí que você sente quando vê algo errado. E essa alegria de quando abraça quem ama. É esse brilho de amor ou fúria que as estatísticas não vão tirar de ti enquanto você lutar. E hoje, é o que vou te pedir para manter aceso.
A vida clama por paz, felicidade e entende o bom como natural. A vida, que busca naturalmente evoluir — inclusive biologicamente — aqui nesse mundo pode nos apresentar lições que precisamos aprender. E nos permitir aceitar quando, por puro acaso, a gente lida com algo que nem precisava ser nosso. É na vida que está o amor. Por isso ele já está dentro de você.
“Seja a mudança que você quer ver no mundo.” E use sua vida para isso.
Por isso não quero que meu incomodo vá embora. O mundo que queremos construir não é o que temos hoje. Queremos contribuir para que o acaso não controle quem pode comer, morar, ter acesso à dignidade. E para criarmos esse mundo sei que precisamos nos conectar com a vida que queremos, para cada um de nós e para aqueles que nem conhecemos. Para isso, espero que eu e você possamos manter a própria força da nossa vida, mesmo quando as probabilidades do mundo não estiverem a nosso favor.
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