Queria que você me ouvisse como se eu fosse música. Com aquela concentração sem esforço de quem mergulha no som e no significado da poesia melódica e se delicia em ouvir a mesma voz repetidas vezes.
Queria a atenção delicada que exige um contrato. Que faz seu revisor se debruçar sobre as ramificações semânticas de cada termo aplicado, com o olhar demorado e minucioso sobre cada linha.
Queria compartilhar o prazer que dividem sommelier e bom vinho. Enquanto um experimenta o novo com cautela e curiosidade, o outro se esparrama e preenche, surpreende e diverte-se ao encantar.
Queria que se encantasse com meus processos como se encanta com suas vendas. E não porque eu gostaria de ser maior que o seu trabalho. Mas porque gostaria de despertar em ti a animação que o dinheiro te desperta.
Porque, como se nota, em toda essa relação eu me via assim: como se eu fosse algo a estar em tuas mãos, passiva e encantadoramente. Música, contrato, vinho, dinheiro. Coisas como essas que te encantavam. E que me encantam, mas sempre em outra proporção. O que era meio de me conectar contigo, para ti eram o fim em si mesmo.
A gente conseguiu compartilhar corpo, comida, lugares, tempo, risadas. Mas não compartilhamos visões de mundo, de felicidade, de sucesso. Acho que nem de riqueza. E nesses casos, em que amamos um mundo e uma pessoa que não cabem no nosso, não há muito o que fazer. Como se eu fosse alguém, me retirei. Com a promessa de nunca mais agir como se eu fosse algo a esperar.